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Gente estranha | Léo Ottesen

Estava olhando pela janela do ônibus e uma senhora de idade subiu. Vinha com sacolas e uma bolsa de couro. Um garoto levantou e insistiu para que ela aceitasse o lugar. Começou a entrar mais gente do que sair e o ônibus lotou. Pedidos de licença, com licença e desculpe iam atravessando a multidão, seguidos de obrigadas. A bela moça de saia preta e blusa azul marinho pouco decotada desceu. Eu a acompanhei. A senhora com as sacolas também desceu, mas pela porta dianteira.

Havia um mendigo na calçada, jornais e uma placa que pedia esmolas. — Bom dia, Serginho. — disse a idosa, enquanto tirava um saco marrom do meio das sacolas plásticas de supermercado. — Bom dia, dona Isabel. — respondeu o indigente. Eu me encostei na parede do prédio e acendi um cigarro. O homem barbudo agradeceu pelos pães e ofereceu um gole de uma garrafa duvidosa à senhora. — Ah, não, meu filho. Eu não bebo. Obrigada e fique com Deus.

Um cachorro vira-latas veio em minha direção e o moço assobiou. O animal sentou à sua frente e ganhou metade de um dos pães. Em duas mordidas, o manjar tinha acabado. Levantou-se e seguiu seu caminho de cão-de-rua. E eu segui o meu.

Uma garçonete saiu do restaurante à minha frente e me pediu o isqueiro. Comentou algo sobre o tempo, mas eu não prestei atenção. Notei a barriga protuberante e o brilho da sua pele. Um homem distinto em um paletó cinza saiu pela porta e entregou uma nota amarela. Enquanto eu dobrava a esquina, ouvi — você não estava lá dentro, então, aqui está a gorjeta.

Cheguei à porta do meu prédio e vi um panfleto colado na parede “Encontrado cão da raça York Shire. Dono favor entrar em contato pelo fone abaixo.”

Na porta do meu apartamento, o síndico estava prostrado com um jornal às mãos. — Circulei alguns empregos que possam te interessar e o meu primo tá precisando de um motorista. Anotei o número dele aqui. — disse, entregando-me o jornal. — E também esquece os três atrasados. Paga esse mês que ficamos quites. Boa tarde.

Entrei em casa, servi um copo de uísque barato e liguei a televisão. A guerra ainda continuava. — É pra pacificar o país! — diziam. — Pra roubar o petróleo! — diziam. Troquei de canal. Um homem é preso por assassinar a filha grávida e o namorado… Um homem-bomba mata vinte e duas pessoas em um parque. Desliguei a televisão.

Comecei a lembrar de tudo que vi durante o dia. De todas as pessoas com quem encontrei. Que gente estranha!


Para ler mais acesse: facebook.com/arotinadosonho

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